quinta-feira, 3 de julho de 2014

TONINHO ENGRAXATE - Personagem de Santo Amaro - Por Estanislau Rybczynski

Santo Amaro e seus personagens - 5, Toninho engraxate.



Todos os bairros, cidades tem seu personagem das mais diversas características, tanto para o bem como para o mal, alegre ou triste, feliz e infeliz, malandros, cômicos e assim por diante.

Em Santo Amaro, principalmente por ser um bairro que já foi município e quase meio milênio de vida teve muitos personagens de todos os tipos e continuou após 1935 quando na calada da noite foi declarado bairro, distante da capital quinze quilômetros, uma mistura de interior e capital.

Um dos personagens mais emblemáticos, que mais marcou a vida de Santo Amaro e um dos mais conhecidos, muito citado em rodas de bate papo e história da região, principalmente por ser santamarense da gema, era o Toninho engraxate, que nasceu Antonio Ferreira da Silva, em vinte e um de Abril de 1913, as 06h00 da manhã no bairro Capela do Socorro, distrito de Santo Amaro, nasceu prematuramente com sete meses de gestação com o parto feito por sua avó, que quando nasceu ela achou estranho, pois a cabeça dele era muito grande e o corpo muito pequeno, talvez isso explicasse seu nanismo, e faleceu em quatro de Maio de 1971 as 15h30, num acidente automobilístico com 58 anos de idade.


Era filho de Amaro Ferreira da Silva, natural de Santo Amaro, filho de portugueses e Francisca Beccari, filha de italianos, ela natural de Taubaté no Vale do Paraíba, tiveram mais quatro irmãos e duas irmãs, inclusive o irmão mais próximo dele foi o Alceu Ferreira da Silva.
Era casado com Duvirges Henrique dos Santos, nascida em Taubaté interior de São Paulo onde a conheceu e casou-se aqui em Santo Amaro na Igreja matriz.

Toninho engraxate morava na Av. João Dias numero 3.161, logo após a ponte João Dias, sentido Vila das Belezas, bairro da Penhinha, bem em frente aos portões da Fábrica de curtume João Dias e depois Plásticos Dias.

Vale salientar que Toninho engraxate, era anão, não por hereditariedade e sim por uma doença, pois todos da família eram pessoas normais em estatura e não chegou a ter filhos biológicos e sim uma adoção de uma criança de dois dias de idade que foi abandonado pelos pais e oferecido a eles em 1952, que o aceitou de imediato, que o batizou com o nome de Carlos Alberto Ferreira da Silva, apelidado carinhosamente de “branco” e mora em Curitiba há uns 30 anos aproximadamente, é casado e possui duas filhas, é empresário e possui também um haras, que parece destino, pois o pai também gostava de cavalos.

Toninho engraxate sempre trabalhou desde a tenra idade, onde com oito anos em 1921 foi trabalhar como engraxate, cobrava cerca de um tostão o par de calçado, e de 1924 a 1925 foi vender frutas pelas ruas do bairro e em 1927 resolveu vir para o Centro de Santo Amaro, onde trabalhou primeiramente em uma fábrica de móveis e depois em mecânica numa pequena indústria, em ambas as empresas teve dificuldades em conseguir trabalho, pois seu nanismo era barreira, mas venceu pela insistência e determinação e ajudava em casa com seus quatrocentos reis que recebia de salário.

Em 1930, já com 17 anos realiza seu sonho de ter um salão de engraxataria em um canto da casa Otelo, onde atraia muitos clientes que aproveitava para engraxar os sapatos, as caixas de engraxate ele mesmo fazia e chegou a ter três conjuntos de caixas.

Nas folgas da engraxataria, principalmente na parte da manhã ele ia trabalhar de cobrador de ônibus que durou dois anos de 1934 a 1936, naqueles ônibus jardineiras que faziam ponto no abrigo rodoviário do Largo Treze de Maio ao lado da igreja matriz.

Em 1937, mudou para outro salão onde foi o banco Arthur Scatena, onde ficou por 13 anos até 1950, quando mudou para o Abrigo rodoviário, onde ficou até Junho de 1958, quando o abrigo foi demolido.
Com a demolição do abrigo Toninho ficou sem sua engraxataria e ficou praticamente noventa dias sem ter o que fazer, tinha mulher e filho para sustentar, teve ajuda dos amigos e para piorar estava sofrendo de uma asma incurável que o prejudicava muito, tinha que tomar seis injeções por dia que ele mesmo aplicava.

Com a união dos amigos ele ia sobrevivendo, até que apareceu uma alma caridosa que foi o farmacêutico de Santo Amaro, Yoshinobu Ito, proprietário da famosa Farmácia Nossa Senhora Aparecida, localizada na Rua Senador Flaquer atrás da matriz, sabendo da sua situação prontamente o atendeu, concedendo a ele parte de um terreno na mesma rua para que ele montasse seu salão novo, ao lado da farmácia e assim sua vida tomou rumo normal outra vez e nesse salão chegou a ter cinco cadeiras de engraxates, empregando alguns meninos.

Durante os anos da Segunda guerra mundial de 1936 a 1945, ele cuidou de cerca de cento e cinqüenta meninos com educação, alimento e emprego com auxilio do povo em geral santamarense.
Na sua profissão e por ser extrovertido, Toninho tinha contato com diversas personalidades do bairro, tanto políticos, como padres, malandros, festeiros e povo em geral ele era o ponto de convergência, um tipo que sabe tudo na região e por isso era amado por uns e odiado por outros, pois tinha personalidade forte, opinião, mas ao meso tempo amável e carismático, tinha opinião própria e por isso discutia com políticos e padre nesse ponto de trabalho normalmente tinha um aspecto e atitudes severas e até carrancudo que trazia medo ou respeito de muitos, mas sempre foi bom e amável com quem tinha contato.

Toninho engraxate alem do seu trabalho, tinha seu passatempo seu momento de lazer, como no futebol, era corintiano e em dia de jogo era feriado para ele, em Santo Amaro gostava de todos os times mas torcia para o palmeirinha e não perdia um jogo, chegou a ser da diretoria do time.


 

Outra atividade era a participação de todas as romarias para Bom Jesus de Pirapora, recebeu várias medalhas como fiel das romarias e ajudava na sua montagem e ia de bicicleta e também com sua charrete, nas viagens do Cenerino Branco de Araujo.

Nessa época era comum a criançada de Santo Amaro e bairros vizinhos irem engraxar sapatos em Santo Amaro e a características eram iguais para todos os meninos, usavam aquelas caixas de madeira triangular, com uma haste ou apoio dos pés (sapato), e que serviam também para encaixar nos ombros e seguir até o destino do trabalho e nas mãos um banquinho também de madeira para sentar, alem da latinha de graxa, uma escovinha para passar graxa, uma escova maior e macia para o brilho e um pedaço de pano para o lustro final os mais cuidadosos usavam quatro palmilhas para encaixar no calçado e as pernas do cliente na altura do tornozelo para não sujar as meias, inclusive lembro bem de alguns amigos de infância que exerceram essa atividade como inicio de vida de labuta.

Toninho, muitas vezes dava trabalho para esses meninos em sua engraxataria, pois eles não tinham ponto fixo e ficavam perambulando pelas esquinas de Santo Amaro atrás de clientes e isso era cansativo além de atrapalhar os transeuntes.

Toninho, dois anos antes de morrer atropelado vinha tendo problema de memória apresentava um quadro de distração muito grande, muitas vezes atravessa as ruas sem olhar, não sabia onde estava indo, precisava de companhia integral para suas atividades, muitas vezes quando saia sozinho foi salvo várias vezes por vizinhos e desconhecidos de ser atropelado e a família parecia adivinhar que um dia esse fato podia acontecer, mas era difícil fazer esse controle e concomitantemente a isso ele também tinha asma e precisava tomar injeção e como era crônico ele mesmo andava com o estojo do medicamento e auto as aplicava.

E, devido a isso teve um fim trágico, foi atropelado em frente a sua casa quando tentava atravessar a rua, Estrada de Itapecerica, vindo do serviço e o acidente ocorreu com o carro caminhonete do Turco Salomão da loja de móveis Vila das Belezas que ficava na esquina da Estrada de Itapecerica e Rua Rafael de Proença, antiga Rua Um, que o socorreu de imediato para o pronto socorro da Santa Casa de Santo Amaro onde constatou que teve contusão cerebral e, por conseguinte hemorragia, o turco foi avisar a família do ocorrido e a família o ausentou do acidente e foi sepultado no cemitério de Santo Amaro.

Entre muitos amigos que teve um se destacou que foi o médico ortopedista Sérgio Mortari, os dois tinham amizade muito grande falavam de todos os assuntos nos tradicionais bares e restaurantes de Santo Amaro, sempre regados a uma cerveja, Sergio Mortari que quando soube de seu acidente, foi logo a Santa Casa e acompanhou a sua enfermidade e fez questão de colaborar no caso de sua fratura junto aos médicos do hospital sem nenhum ônus a ele.

A mãe de Toninho, D. Francisca Beccari, tinha uma pensão em Santo Amaro na Rua Brasilio Luz, eles tinham uma chácara onde foi à indústria Metal Leve, para os quais foi vendido para a instalação da indústria e ali ao lado tinha o depósito das lojas Sgarbi, onde havia os estoques de Areias, pedra madeira e todo material inerente a uma obra e a loja propriamente dita era na Alameda Santo Amaro lado direito após a Rua Belchior de Pontes, atual Rua Gal Roberto Alves de Carvalho Filho.

Todos que o conheceram são unânimes em dizer de sua simpatia, bondade e participação em todos os eventos santamarenses como Romarias, Esportes, festa do divino, participou com muita ênfase da inauguração do monumento a Borba Gato, obra de Julio Guerra, e todas as atividades religiosas, parecia que todo seu trabalho sua renda era dedicada principalmente às romarias, tinha sua charrete bem cuidada com a qual usava para sair aos fins de semana e visitar amigos, só não saia quando tinha jogo do Corinthians pela televisão e também ia todo ano ao santuário de Bom Jesus de Pirapora, da romaria do Cenerino, para trabalhar ia de ônibus que tomava praticamente em frente a sua casa.

Toninho representou bem a figura do santamarense simples e trabalhador, um botina amarela na acepção do termo, por ser filho da terra e por pisar no barro amarelo do bairro para ganhar a vida, sofrendo de preconceitos, mas nunca deixou de ser diminuído e se impôs sobre as injustiças que lhe quiseram determinar.
 
Estanislau Rybczynski


 

3 comentários:

  1. Boa tarde Jomar
    Grato por sua postagem
    Vamos revelando Santo Amaro no que diz respeito às pessoas populares também.
    abraços.

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  2. Com certeza, Estanislau! É uma satisfação contribuir para a divulgação da história de Santo Amaro e de seus personagens.

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  3. Tenho em mente um desejo, um projeto que já comentei com o pessoal da cultura de Santo Amaro que se trata de homenagear pessoas que fizeram a história de Santo Amaro independente de seu grau de instrução, tenho já escrito em forma de cronica oito personagens entre intelectuais ou não e sei que muitos aqui nesse FBBA, conhecem muitoas figuras folcloricas de Santo Amaro, mas a maioria só conhece o nome ou apelido, urge para nossa memória uma biografia mais completa possivel e publicá-las.

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